Mais de 500 produtores rurais participaram de uma audiência pública realizada na tarde da última sexta-feira (11), em Içara, para discutir o Projeto de Lei 10/2023, que propõe mudanças no sistema de classificação do tabaco em Santa Catarina. O evento foi promovido pela Assembleia Legislativa do Estado, com o objetivo de ouvir os produtores sobre a proposta que prevê a avaliação da qualidade do fumo diretamente nas propriedades rurais.
A audiência ocorreu no salão São Judas Tadeu, no bairro Poço 8, e foi proposta pelo deputado estadual Rodrigo Minotto (PDT). A autoria do PL é do deputado Sargento Lima (PL). Minotto, que já havia participado de debates semelhantes em Canoinhas, destacou a importância de ampliar o diálogo entre produtores, indústrias e representantes públicos.
Proposta busca mais transparência e equilíbrio
Pelo modelo atual, no sistema integrado de produção, as empresas fumageiras fornecem insumos, assistência técnica e garantem a compra da safra. Em contrapartida, os agricultores disponibilizam a terra e a mão de obra. A classificação do tabaco, no entanto, é feita pelas empresas após o recebimento do produto, o que, segundo os produtores, gera insegurança e prejuízos.
A proposta do PL 10/2023 busca mudar esse cenário. Se aprovado, permitirá que os produtores solicitem a classificação do tabaco ainda na propriedade, antes da entrega. Com isso, os agricultores poderiam buscar outros compradores caso discordem do preço estipulado pela empresa.
“Queremos valorizar o produtor rural, mas também respeitar o papel da indústria. Buscamos o equilíbrio entre as partes”, afirmou o deputado Minotto. Ele também destacou o papel relevante de Santa Catarina na cadeia produtiva do fumo, responsável por cerca de 30% da produção nacional e sustentando mais de 40 mil famílias.
Deputados defendem mais autonomia ao agricultor
Durante o evento, o deputado José Milton Scheffer (PP) reforçou que a medida pode representar um avanço para os produtores, devolvendo a eles o poder de decisão sobre sua produção.
“Talvez seja o único produto que sai da propriedade sem que o produtor saiba quanto vai receber. Isso é constrangedor”, afirmou. Ele ainda citou como exemplo uma legislação semelhante já em vigor no Rio Grande do Sul, que poderia servir de referência para Santa Catarina.
Já o deputado federal Rafael Pezenti (MDB), também presente na audiência, elogiou a mobilização dos agricultores. “Vocês são muito mais fortes do que imaginam. É hora de despertar e exigir mais respeito e justiça no processo de comercialização”, declarou.
Produtores pedem liberdade de escolha
O agricultor Gustavo Ordem foi um dos que defenderam a proposta. Para ele, a classificação feita nas propriedades traria mais justiça e transparência.
“Hoje, mandamos o produto e só depois ficamos sabendo o quanto vamos receber. Se a classificação for feita em casa, saberei o valor antes e decidirei se quero vender ou não”, explicou.
Indústria questiona custos e viabilidade
Apesar do apoio dos produtores, representantes da indústria fumageira demonstraram preocupação com os impactos da proposta. Carlos Humberto, do Sindicato da Indústria do Tabaco, argumentou que a mudança exigiria reestruturações logísticas e operacionais, além de gerar custos adicionais com transporte, iluminação adequada e deslocamento de classificadores.
“A estrutura atual já é consolidada. A proposta precisa ser amplamente debatida para evitar prejuízos às empresas”, alertou.
O projeto prevê, inclusive, mecanismos de arbitragem para resolver possíveis divergências na classificação. Caso não haja consenso entre as partes, um terceiro poderá ser indicado para arbitrar a situação. Todos os custos com a classificação ficariam sob responsabilidade da empresa compradora.
Produção nacional e cenário internacional
O Brasil é o maior exportador de tabaco do mundo desde 1993 e o segundo maior produtor mundial. A atividade está concentrada principalmente nos estados do Sul. Na safra 2023/2024, o país produziu 606 mil toneladas, sendo 43% no Rio Grande do Sul, 30% em Santa Catarina e 27% no Paraná.
Santa Catarina colheu 183 mil toneladas de fumo e é o segundo maior produtor do país. Ao todo, 133 mil agricultores cultivaram tabaco em 284 mil hectares no Sul do Brasil, gerando uma receita bruta de R$ 11,8 bilhões, conforme dados da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra). A produção brasileira abastece 113 países.
Próximos passos
Ao final da audiência, o deputado Minotto propôs a criação de um grupo de trabalho com parlamentares de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, além de representantes de entidades locais, para discutir os efeitos da legislação gaúcha e aprimorar o projeto catarinense.
O PL 10/2023 está atualmente em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa, junto com outros dois projetos apensados: o PL 38/2023, do deputado Altair Silva (PP), e o PL 276/2024, do deputado suplente Rodrigo Preis (PT).